domingo, 9 de novembro de 2014

Bom Dia Alentejo, Alter do Chão, Apodo de Alter do Chão, onde a terra é plana e de muita história

ALTER DO CHÃO – Como esta vila vai comemorar os 750 anos, do primeiro foral que lhe foi concedido, a revista “A Cidade” achou por bem associar-se às comemorações, consagrando-lhe este número. Aqui deixo também o meu modesto contributo, escrevendo umas palavras concernentes ao apodo aplicado aos alterenses, que talvez para alguns seja desconhecido. Eu aqui, apenas, limito-me a recordá-lo e nada mais.
- MULATOS – Aplicam este apodo aos alterenses, acrescentando de Alter.
- Da pequenina e interessante e interessante monografia – Alter do Chão (Uma das vilas mais interessantes do Alentejo) – conferência na Casa do Alentejo, em Lisboa, em 18 de Novembro de 1940, proferida pelo Dr. Rafael Salinas Calado, e publicada em 1944, transcrevo o seguinte, da pág. 18:
“Não consegui averiguar a origem pejorativa e sem razão de ser a designação de MULATOS DE ALTER, aos homens da minha terra.
Gama Lobo, aí também por 1860, publicou em A Voz do Alentejo um artigo que explicava a razão do apodo, mas a citação usada do jornal, na Biblioteca Transtagana, e a morte do seu compilador, o trabalhador incansável António José Torres de Carvalho, impediram-me de obter os esclarecimentos de que precisava a este respeito.
MULATOS é coisa que lá não existe, agora trigueiros e às vezes bem carregados, como eu, há-os por lá e muitos, sem que essa circunstância constitua, talvez, aleijão, como poderão ver, por esta quadra de dança das saias, que as raparigas do meu tempo cantavam lá então:
Andas morta por saber
Quem é o meu ramalhete
É um rapaz Trigueirinho
Vestido de azul ferrete.
Isto sempre é uma consolação para as pessoas a quem Deus Nosso Senhor deitou a este mundo um poucochinho mais carregado de cor.
Da pág. 17 da aludida conferência transcrevo o seguinte respeitante ao modo de dizer, muito usual em Alter do Chão:
À unha, Gente de Alter! – Um dos seus divertimentos é a tourada, onde se atira para a cabeça dos bois sem medo e com denodo. Quantas vezes, ouvi o grito: “À unha, gente de Alter!”.
Ao investigar diversos números de A Voz do Alentejo existentes na Biblioteca Municipal de Elvas, encontrei a razão do apodo “MULATOS” aplicado aos habitantes de Alter do Chão, no artigo intitulado – Motivo por que chamam aos alterenses, “Mulatos de Alter do Chão”, da autoria de Manuel de Gama Lobo, inserto nas págs. 3 e 4 do n.º 30, de 11 de Julho de 1860, que passo a transcrever, usando a ortografia de hoje:
“Decorrido o mês de Agosto da era cristã do ano de 1382, EL-REI D. Pedro, o Justiceiro, andava em correição pelas terras dos seus reinos; chegou à viçosa e encantadora vila de Alter do Chão. Alojaram-no numas casas, cujas janelas ficavam defronte de uma perene fonte. Deu um banquete aos fidalgos da sua comitiva, como tinha por costume, e depois despediu-os: Era noite. D. Pedro puxa um escabelo para junto de uma janela, assenta-se nele, firma um dos cotovelos no parapeito e encosta a face na mão e assim fica pensativo a meditar por muito tempo.

Foto: Paulo Moreira, http://retratosdeportugal.blogspot.pt/2011/04/alter-do-chao-largo-dr-joao-pestana-e.html
Tira-o deste letargo uma mui algazarra. Eram mulheres que se chamavam reciprocamente os nomes das festas.
O primeiro intento foi ir à fonte e tirar do cinto o açoute com que tinha açoutado o bispo do Porto, e ir açoutar por sua própria mão todo aquele mulherio infame, mas manteve-se; continuou a algazarra; e a coisa tomava incremento e já quase ia a passar a vias de facto quando uma diz para a outra – “Anda, velhaca: tu sempre hás-de ser Maria Rousada
Nesse tempo, o nome de rousada não era lá das melhores coisas por ser pouco honroso. D. Pedro, que isto ouviu, em continente, mandou chamar a mulher e pergunta-lhe por que lhe chamam tal nome. A mulher cora de vergonha, acanha-se, mas finalmente confessa que passando por umas vinhas, seu marido abusava da sua fraqueza e a forçara; mas que depois tinha casado com ela e viviam muito satisfeitos.
Não importa, diz o rei, cheio de cólera – foi um crime atroz! Seja já e já enforcado, pois desonrou uma donzela indefesa! A mulher pede, roga, suplica de mãos postas e acaba desmaiando. O marido foi imediatamente enforcado!...
- “Hei-de ensinar este povo desmoralizador e devasso! Eu o mandarei castigar” – dizia o rei, cheio de cólera, batendo com o punho no dofete.
Em seguida, mandou para Alter do Chão, imensidade de pretos, cada um com seu açoute, autorizados para zurzir todo aquele que escorregasse um pé. Os pretos familiarizaram-se com a gente da terra. Algumas mulheres da plebe, de boa boca e melhor aceitar casaram com eles, tiveram filhos, MULATOS.
Os habitantes das terras circunvizinhas, quando iam, por qualquer motivo a Alter do Chão, vendo alguns Mulatinhos, principiaram a chamar aos alterenses, MULATOS DE ALTER DO CHÃO, alcunha que hoje ainda têm os alterenses.
Fonte: Alexandre de Carvalho Costa, Apodos Tópicos Alentejanos, Revista Cidade, Portalegre